Dito no Pacaembu
Por
Pablo Neruda
Quantas
coisas quisera hoje dizer, brasileiros,
quantas
histórias, lutas, desenganos, vitórias,
que
levei anos e anos no coração para dizer-vos, pensamentos
e
saudações. Saudações das neves andinas,
saudações
do Oceano Pacífico, palavras que me disseram
ao
passar os operários, os mineiros, os pedreiros, todos
os
povoadores de minha pátria longínqua.
Que me
disse a neve, a nuvem, a bandeira?
Que
segredo me disse o marinheiro?
Que me
disse a menina pequenina dando-me espigas?
Uma
mensagem tinham. Era: cumprimenta Prestes.
Procura-o,
me diziam, na selva ou no rio.
Aparta
suas prisões, procura sua cela, chama.
E se
não te deixam falar-lhe, olha-o até cansar-te
e nos
conta amanhã o que viste.
Hoje
estou orgulhoso de vê-lo rodeado
por um
mar de corações vitoriosos.
Vou
dizer ao Chile: Eu o saudei na viração
das bandeiras
livres de seu povo.
Me
lembro em Paris, há alguns anos, uma noite
falei à
multidão, fui pedir auxílio
para a
Espanha Republicana, para o povo em sua luta.
A
Espanha estava cheia de ruínas e de glória.
Os
franceses ouviam o meu apelo em silêncio.
Pedi-lhes
ajuda em nome de tudo o que existe
e lhes
disse: Os novos heróis, os que na Espanha lutam, morrem,
Modesto,
Líster, Pasionaria, Lorca,
são
filhos dos heróis da América, são irmãos
de
Bolívar, de O' Higgins, de San Martín, de Prestes.
E
quando disse o nome de Prestes foi como um rumor imenso.
no ar
da França: Paris o saudava.
Velhos
operários de olhos úmidos
olhavam
para o futuro do Brasil e para a Espanha.
Vou
contar-vos outra pequena história.
Junto
às grandes minas de carvão, que avançam sob o mar,
no
Chile, no frio porto de Talcahuano,
chegou
uma vez, faz tempos, um cargueiro soviético.
Quando
a noite chegou
vieram
aos milhares os mineiros, das grandes minas,
homens,
mulheres, meninos, e das colinas,
com
suas pequenas lâmpadas mineiras,
a noite
toda fizeram sinais, acendendo e apagando,
para o
navio que vinha dos portos soviéticos.
Aquela
noite escura teve estrelas:
as
estrelas humanas, as lâmpadas do povo.
Também
hoje, de todos os rincões
da
nossa América, do México livre, do Peru sedento,
de
Cuba, da Argentina populosa,
do
Uruguai, refúgio de irmãos asilados,
o povo
te saúda, Prestes, com suas pequenas lâmpadas
em que
brilham as altas esperanças do homem.
Por
isso me mandaram, pelo vento da América,
para
que te olhasse e logo lhes contasse
como
eras, que dizia o seu capitão calado
por
tantos anos duros de solidão e sombra.
Vou
dizer-lhe que não guardas ódio.
Que só
desejas que a tua pátria viva.
E que a
liberdade cresça no fundo
do
Brasil como árvore eterna.
Eu
quisera contar-te, Brasil, muitas coisas caladas,
carregadas
por estes anos entre a pele e a alma,
sangue,
dores, triunfos, o que devem se dizer
o poeta
e o povo: fica para outra vez, um dia.
Peço
hoje um grande silêncio de vulcões e rios.
Um grande
silêncio peço de terras e varões.
Peço
silêncio à América da neve ao pampa.
Silêncio:
com a palavra o Capitão do Povo.
Silêncio:
que o Brasil falará por sua boca.
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