Quando o pastor, novo administrador do Serviço Municipal de Saúde,
adentrou o hospital público mantido pela prefeitura e se deparou com a enorme
imagem de Nossa Senhora Aparecida, exposta num pedestal de mármore branco, não
conseguiu conter a ira e avançou violentamente sobre a santa numa fúria
demente, aplicando saraivada de murros, tapas e cotoveladas, fazendo-a
minúscula, como que encolhida, sequiosa por algum tipo de trincheira ou proteção.
Ao tempo em que espancava, o gestor protestante gritava aleives, palavras
impronunciáveis, hediondas heresias e a Senhora Mãe de Deus restava prostrada
no chão, feita em diminutos fragmentos.
O gestor estrilava obrigando o sangue rajar convulsivamente, ameaçando
romper as paredes da jugular. Bramia sobre o ato pecaminoso de cultuar imagens,
vociferando os ensinamentos bíblicos que proíbem tais disparates. Atordoava os
ouvidos denunciando a frontal desobediência às leis de Deus, tão pormenorizadamente
expressas no livro dos livros, no compêndio divino. Apontava o fogo do inferno
como destino dos infiéis apreciadores de imagens, enquanto pulverizava o ar com
os minúsculos pedaços a que reduziu a santa, como que certificando que o
contencioso não passava de barro amassado e cozido a fogo brando, preenchido
por vento ordinário e cediço.
A cada rompante destilava ira e ódio. E asseverava a
inconstitucionalidade dado que, sendo o estado brasileiro laico, a
promiscuidade verificada entre religião e coisa pública estava categoricamente vedada.
Todavia, se à oportunidade, providencialmente, propagava o caráter secular
do estado nacional, convenientemente permitiu-se esquecer que, na semana
anterior, orientou a bancada de vereadores evangélica a aprovar projeto de lei
obrigando fosse a bíblia disposta sobre todas as mesas das repartições públicas
e, ainda, sobre todas as carteiras escolares das unidades educacionais mantidas
pela municipalidade.
Tanta bulha fez o administrador evangélico que médicos, enfermeiros e
pacientes, pasmos com a sandice em curso, correram com o que restou da
imaculada santa.
O Pastor Nazareno Gustavo inspirava medo. No ano anterior, após ter doutrinado
os servidores lotados na Delegacia de Polícia e na Guarda Municipal, organizou
sua milícia particular. Mantinha sob férreo comando um disciplinado e bem
treinado efetivo de dois mil e quinhentos homens, mobilizados para o combate
militar.
Não se sabe as razões, mas fixou na mente a ressurreição das Cruzadas,
guerra em que se digladiaram cristãos e muçulmanos e que se estendeu de 1.095 a
1.270. Traçou então a meta obstinada e extemporânea: reiniciada a guerra, iria
à desforra invertendo o resultando da contenda, conduzindo finalmente os
cristãos à vitória peremptória.
Durante boa parte da vida estudou as expedições armadas medievais.
Decorou o discurso do Papa Urbano II, quando no Conselho de Clermont
pregou a necessidade de libertar a Terra Santa dos turcos seljúcidas.
Como quisesse tornar o passado presente, reproduziu a vestimenta dos
guerreiros cristãos medievais, distribuindo aos seus cruzados uma indumentária
que ostentava no peito enorme cruz, além de armadura completa, espada, lança,
escudo, bandeiras e estandartes, complementados por uma parafernália de
adereços que ornamentavam os cavalos.
A primeira ação guerreira que encetou foi a invasão do terreiro de umbanda
Pai Salomão. Planejou-a em minúcias para que nada escapasse ao controle. Uma
guerra contra os negros seria bom teste para verificar o nível de treinamento
das colunas uma vez que a guerra verdadeira para a qual se preparava seria
contra os muçulmanos, que julgava mais perigosos em função do fundamentalismo e
da ilimitada devoção a Maomé.
O terreiro de umbanda Pai Salomão era um patrimônio cultural da
humanidade. Reconhecido pela ONU numa solenidade em que estiveram presentes
autoridades de todas as paragens, a comunidade abrigava um sítio histórico e um
centro espírita que remontava ao período da escravidão. Originou-se de um
antigo quilombo implacavelmente perseguido pelos capitães de mato, mas que heroicamente
resistiu graças aos zumbidos que a capoeira de Angola emprestava ao mover das
pernas negras, longas e rijas dos kalungas.
Aplicar uma humilhante derrota àqueles remanescentes de escravos seria
um ato de repercussão mundial: daria publicidade à causa de arregimentar
cristãos para, numa cruzada revitalizada, aplicar solução final ao problema dos
negros, mulheres, homossexuais, minorias, imigrantes, defensores da ética na
política e, sobretudo, fundamentalistas islâmicos.
Insistia com seu rebanho sobre a necessidade da nova ofensiva ser
blindada, de sorte a impedir imprevistos. Relembrou o retumbante fiasco da última
incursão cruzada, quando investiram sobre o Parque Vaca Brava de Goiânia tentando
impedir a exposição Orixás da Bahia, mostra de belíssimas esculturas do artista
Tatti Moreno.
Escolheu então o dia 15 de julho para invadir o terreiro.
Propositalmente o mesmo dia e mês que, em 1.099, a cruzada comandada por
Godofredo de Bouillon, após sitiar Jerusalém, adentrou a cidade portal de todos
os credos. Passou a prestar uma obsequiosa veneração a Bouillon após ler nos
documentos históricos sua recusa em ser coroado rei de Jerusalém para “não por
à cabeça uma coroa de ouro no mesmo lugar em que Jesus Cristo, Rei dos Reis,
fora coroado de espinhos”.
Convenientemente o pastor esquecera de parte significativa da história
medieval: apesar do desenvolvimento verificado nas áreas comercial, cultural e
militar, as cruzadas foram um fracasso, pois não alcançaram o objetivo
principal, libertar Jerusalém.
O zagal e seu exército de milicianos aguardaram com impaciência a
chegada do dia escolhido para perpetrar o mal.
O terreiro estava repleto de pessoas quando se viu devassado por uma
força de encapuzados trajando armaduras metálicas, montando ostensivos manga
larga marchadores, portando nas mãos espadas, lanças, estandartes e tochas
incandescentes. (Para ler o conto completo, clique aqui).
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Dramaturgo, o autor transferiu para seus contos literários toda a criatividade, intensidade e dramaticidade intrínsecas à arte teatral.
São vinte contos retratando temáticas históricas e contemporâneas que, permeando nosso imaginário e dia a dia, impactam a alma humana em sua inesgotável aspiração por guarida, conforto e respostas.
Os contos:
1. Tiradentes, o mazombo
2. Nossa Senhora e seu dia de cão
3. Sobre o olhar angelical – o dia em que Fidel fuzilou Guevara
4. O lugar de coração partido
5. O santo sudário
6. Quando o homem engole a lua
7. Anos de intensa dor e martírio
8. Toshiko Shinai, a bela samurai nos quilombos do cerrado brasileiro
9. O desterro, a conquista
10. Como se repudia o asco
11. O ladrão de sonhos alheios
12. A máquina de moer carne
13. O santuário dos skinheads
14. A sorte lançada
15. O mensageiro do diabo
16. Michelle ou a Bomba F
17. A dor que nem os espíritos suportam
18. O estupro
19. A hora
20. As camas de cimento nu
OUTRAS OBRAS DO AUTOR QUE O LEITOR ENCONTRA NAS LIVRARIAS amazon.com.br:
São vinte contos retratando temáticas históricas e contemporâneas que, permeando nosso imaginário e dia a dia, impactam a alma humana em sua inesgotável aspiração por guarida, conforto e respostas.
Os contos:
1. Tiradentes, o mazombo
2. Nossa Senhora e seu dia de cão
3. Sobre o olhar angelical – o dia em que Fidel fuzilou Guevara
4. O lugar de coração partido
5. O santo sudário
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A – LIVROS INFANTO-JUVENIS:
Livro 1. As 100 mais belas fábulas da humanidade
I – Coleção Educação, Teatro & Folclore (peças teatrais infanto-juvenis):
Livro 1. O coronel e o juízo final
Livro 2. A noite do terror
Livro 3. Lobisomem – O homem-lobo roqueiro
Livro 4. Cobra Honorato
Livro 5. A Mula sem cabeça
Livro 6. Iara, a mãe d’água
Livro 7. Caipora
Livro 8. O Negrinho Pastoreiro
Livro 9. Romãozinho, o fogo fátuo
Livro 10. Saci Pererê
II – Coleção Infantil (peças teatrais infanto-juvenis):
Livro 1. Não é melhor saber dividir
Livro 2. Eu compro, tu compras, ele compra
Livro 3. A cigarra e as formiguinhas
Livro 4. A lebre e a tartaruga
Livro 5. O galo e a raposa
Livro 6. Todas as cores são legais
Livro 7. Verde que te quero verde
Livro 8. Como é bom ser diferente
Livro 9. O bruxo Esculfield do castelo de Chamberleim
Livro 10. Quem vai querer a nova escola
III – Coleção Educação, Teatro & Democracia (peças teatrais infanto-juvenis):
Livro 1. A bruxa chegou... pequem a bruxa
Livro 2. Carrossel azul
Livro 3. Quem tenta agradar todo mundo não agrada ninguém
Livro 4. O dia em que o mundo apagou
IV – Coleção Educação, Teatro & História (peças teatrais juvenis):
Livro 1. Todo dia é dia de independência
Livro 2. Todo dia é dia de consciência negra
Livro 3. Todo dia é dia de meio ambiente
Livro 4. Todo dia é dia de índio
V – Coleção Teatro Greco-romano (peças teatrais infanto-juvenis):
Livro 1. O mito de Sísifo
Livro 2. O mito de Midas
Livro 3. A Caixa de Pandora
Livro 4. O mito de Édipo.
B - TEORIA TEATRAL, DRAMATURGIA E OUTROS
VI – ThM-Theater Movement:
Livro 1. O teatro popular de bonecos Mané Beiçudo: 1.385 exercícios e laboratórios de teatro
Livro 2. 555 exercícios, jogos e laboratórios para aprimorar a redação da peça teatral: a arte da dramaturgia
Livro 3. Amor de elefante
Livro 4. Gravata vermelha
Livro 5. Santa Dica de Goiás
Livro 6. Quando o homem engole a lua
Livro 1. As 100 mais belas fábulas da humanidade
I – Coleção Educação, Teatro & Folclore (peças teatrais infanto-juvenis):
Livro 1. O coronel e o juízo final
Livro 2. A noite do terror
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Livro 4. Cobra Honorato
Livro 5. A Mula sem cabeça
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Livro 9. Romãozinho, o fogo fátuo
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II – Coleção Infantil (peças teatrais infanto-juvenis):
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Livro 6. Todas as cores são legais
Livro 7. Verde que te quero verde
Livro 8. Como é bom ser diferente
Livro 9. O bruxo Esculfield do castelo de Chamberleim
Livro 10. Quem vai querer a nova escola
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Livro 1. Todo dia é dia de independência
Livro 2. Todo dia é dia de consciência negra
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Livro 4. Gravata vermelha
Livro 5. Santa Dica de Goiás
Livro 6. Quando o homem engole a lua