O homem indica dois
ministros do TSE que, na sequência o absolvem. Com a chave do cofre nas mãos
compra governadores e o parlamento. E, como aperitivo, o que vai abaixo:
Temer indicará negociador de acordo da J&F
A posição de
confronto assumida pelo presidente da República, Michel Temer, contra seu
delator Joesley Batista, tem potencial para estabelecer uma situação de
conflito de interesses - ou, na melhor das hipóteses, de criar constrangimento
- na negociação do acordo de leniência que a J&F ainda terá que formalizar
com a Controladoria-Geral da União (CGU).
Embora a empresa já
tenha se acertado com o Ministério Público Federal no Distrito Federal
(MPF-DF), é a CGU que tem o papel legal de aplicar a Lei Anticorrupção e de
negociar ou não acordos com as empresas envolvidas.
O órgão está hoje
debaixo do Ministério da Transparência, que está com comando vago desde a ida
de Torquato Jardim para a pasta da Justiça. Ou seja, Temer deverá indicar, nos
próximos dias ou semanas, o nome do ministro que vai conduzir o processo contra
o grupo J&F dentro da CGU.
Em nota divulgada
no sábado, após Joesley chamar Temer de chefe da quadrilha do PMDB da Câmara em
entrevista à revista "Época", o presidente da República fez duras críticas
aos termos do acordo de leniência negociado pela J&F com o MPF-DF.
"[Joesley] obtém perdão pelos seus delitos e ganha prazo de 300 meses para
devolver o dinheiro da corrupção que o tornou bilionário, e com juros
subsidiados. Pagará, anualmente, menos de um dia do faturamento de seu grupo
para se livrar da cadeia. O cidadão que renegociar os impostos com a Receita
Federal, em situação legítima e legal, não conseguirá metade desse prazo e
pagará juros maiores", declarou Temer, na nota.
Conforme o acordo
fechado com o MPF-DF, a J&F se comprometeu a pagar o valor nominal de R$
10,3 bilhões, parcelados em 25 anos, com correção pelo IPCA.
A falta de
histórico de aplicação da Lei Anticorrupção brasileira complica o cenário. A
legislação entrou em vigor em 2014, foi regulamentada em 2015, mas até hoje não
há um caso prático de aplicação da lei pela CGU tornado público, embora haja
processos em andamento e em negociação.
No acordo fechado
com a Odebrecht, já homologado pelo juiz Sergio Moro, o MPF cita uma série de
leis - colaboração premiada, lavagem de dinheiro, duas convenções das Nações
Unidas ratificadas pelo Brasil para o combate a corrupção e a própria Lei
Anticorrupção, entre outras - para embasar seu poder de negociar a leniência.
Mas a procuradoria
reconhece que outros órgãos também tem papel no processo de "limpeza do
nome" de empresas envolvidas com corrupção - notadamente Advocacia Geral
da União, Tribunal de Contas da União e também a CGU - e se compromete a fazer
"gestões" para que esses órgãos reconheçam de alguma forma os termos
negociados com o MPF.
Uma das formas de
estímulo para adesão é que as provas fornecidas pela empresa no âmbito do
acordo com o MPF só podem ser usadas por outros órgãos se eles aceitarem seus
termos.
Em manifestação pública
anterior, a CGU já disse que os acordos de leniência que negocia
"pautam-se pela rigorosa e estrita observância de critérios técnicos, além
da constante interlocução com outros órgãos de controle". "E neste
contexto de permanente colaboração e diálogo, é certo que não há impedimento
para que, sem prejuízo das competências atribuídas pela Lei Anticorrupção, a
CGU também considere a colaboração ofertada pelas empresas com esses outros
órgãos (MPF e TCU), não só nos acordos de leniência aqui celebrados, mas também
nos próprios processos de responsabilização em curso ou que vierem a ser
iniciados por esta Pasta", diz o Ministério da Transparência em seu site.
Em consulta por
e-mail feita pelo Valor antes da entrevista de Joesley - mas já depois da saída
de Torquato Jardim -, a CGU respondeu, sem citar caso específico, que "tem
defendido a possibilidade de compensação dos valores já pagos a partir dos
acordos celebrados com o MPF em relação aos mesmos fatos ilícitos".
A Lei Anticorrupção
prevê aplicação de multa de até 20% do faturamento da empresa no ano anterior
ao da abertura do processo. O decreto 8.420 regulamenta o cálculo da pena,
listando fatores que aumentam e reduzem o percentual a ser cobrado (ver tabela
acima).
Isso limita, mas
não elimina, a discricionariedade de quem vier a aplicá-la. Resta o poder para
calibrar a redução da pena pela existência do acordo de leniência. A lei fala
em diminuição de "até dois terços" no valor da multa calculada
conforme o decreto. Mas não exige redução de dois terços.
Quando fixou o
valor nominal recorde de R$ 10,3 bilhões para a leniência, o MPF mencionou, sem
citar o critério da conta, que a cifra representava 5,62% do faturamento do
grupo J&F em 2016, e que este percentual era o médio do que havia sido
aplicado nos acordos de Odebrecht, Braskem, Camargo Corrêa e Andrade Gutierrez.
Quando a multa da
J&F é calculada a valor presente (ainda prevendo correção pela Selic),
ficaria com valor próximo de R$ 7 bilhões, o que ainda seria o maior do tipo já
aplicado a uma empresa por corrupção no mundo.
Por Fernando Torres, no Valor Econômico
_________________
Para saber sobre o livro, clique aqui. |