A comunidade científica não tem mais dúvida sobre a mudança climática causada por atividades humanas.
A DW explica como o estudo do clima evoluiu para o consenso científico
sobre o aquecimento global.
É verdade que, dentro de sua história de 4,5 bilhões de anos, o planeta
Terra experimentou eras de menor e maior calor.
Numa alternância de milhares de anos, essas mudanças foram determinadas
por variações na órbita da Terra ao redor do Sol. Enquanto distâncias maiores
resultaram em ciclos mais frios, a proximidade gerou eras mais quentes e
interglaciais.
No final do século 20, quando cientistas começaram a observar como as
temperaturas mudaram ao longo da história, eles notaram um aquecimento
planetário muito mais rápido que a média, iniciado a partir dos anos 1980.
Em 1998, pesquisadores da Universidade de Massachusetts e do Laboratório
de Pesquisas de Anel de Árvore da Universidade do Arizona, ambas nos Estados
Unidos, publicaram um estudo mostrando a temperatura média anual global durante
os últimos mil anos.
Para calcular temperaturas tão antigas, eles estudaram os chamados
registros naturais – medições de núcleos de gelo, anéis de árvores e corais.
O resultado mostrou pouca variação durante muitas centenas de anos até o
século 20, quando subitamente houve um aumento acentuado.
Em 2013, uma pesquisa publicada na revista Science analisou temperaturas
ainda anteriores, datando de 11 mil anos atrás. A conclusão foi a mesma: o
planeta aqueceu mais rápido no século passado do que em qualquer outra época
desde o final da última era glacial.
O estudo também revelou que, nos últimos 2 mil anos, a Terra vem
enfrentando um período de resfriamento natural em termos de sua posição em
relação ao Sol.
Mas, como explica o estudo, esse resfriamento natural praticamente não foi
notado devido ao aquecimento sem precedentes causado pelas emissões humanas de
gases de efeito estufa.
O que as emissões de CO2 têm a ver com a mudança climática?
O efeito estufa – um processo natural que aquece a Terra – é necessário
para sustentar a vida no planeta. Ele acontece quando certos gases em nossa
atmosfera capturam o calor emitido pela Terra e atuam como o próprio efeito
estufa do planeta. Os gases naturais que retêm o calor em nossa atmosfera, que
incluem dióxido de carbono (CO2), metano e óxido nitroso, são necessários para
manter a temperatura da superfície da Terra quente.
Sem o efeito estufa, a temperatura da superfície cairia 33 graus Celsius,
de acordo com a Organização Meteorológica Mundial (OMM). Isso tornaria o
planeta um lugar congelado e inabitável.
Durante milhares de anos, a natureza regulou bem a concentração desses
gases. Mas isso começou a mudar quando os seres humanos passaram a queimar
combustíveis fósseis para criar energia, o que desencadeou um aumento acentuado
das emissões não naturais de CO2. Isso interferiu no equilíbrio atmosférico do
planeta e, como resultado, a Terra começou a aquecer mais rapidamente.
De acordo com o relatório da OMM sobre o Estado do Clima Global 2020, a
temperatura média no ano passado foi 1,2 grau Celsius mais alta do que os
níveis pré-industriais. Isso se refere ao período entre 1850-1900, quando os
combustíveis fósseis não eram amplamente utilizados como meio para gerar
energia.
O relatório descreveu os níveis crescentes de gases de efeito estufa na
atmosfera resultantes das atividades humanas como "um dos principais
motores das mudanças climáticas".
Em 2001, o Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC)
estimou que a concentração de CO2 na atmosfera havia sido de 280 partes por
milhão (ppm) por vários milhares de anos antes da era industrial. Em 1999,
havia aumentado para 367 ppm.
Criado como um órgão da ONU em 1988, o IPCC tem 195 países-membros e se
ocupa da ciência relacionada à mudança climática. Ele atribuiu o aumento de CO2
atmosférico às emissões geradas pelo homem, três quartos delas provenientes da
queima de combustíveis fósseis, e o restante da mudança no manejo da terra.
Em maio de 2021, o nível médio global de CO2 atmosférico atingiu 415 ppm.
A última vez em que os níveis de CO2 haviam sido tão elevados foi há cerca de 3
milhões de anos, quando o nível do mar era cerca de 30 metros mais alto, e os
humanos modernos nem sequer existiam.
O cientista climático Benjamin Cook, do Instituto Goddard para Estudos
Espaciais da Nasa, explica que, no final do século 20, quando os pesquisadores
começaram a procurar respostas para explicar a tendência de aquecimento, eles
examinaram diferentes fatores, incluindo gases de efeito estufa, energia solar,
circulação oceânica e atividade vulcânica.
"Somente as emissões de gases de efeito estufa dos combustíveis
fósseis e a industrialização nos deram uma previsão que se alinha com o
aquecimento que estamos vendo", disse Cook à DW.
Ele afirma que a comunidade científica está tão confiante na mudança
climática causada pelo homem hoje quanto na compreensão da teoria da gravidade.
"Há incertezas e nuances a serem discutidas na ciência
climática", comenta Cook. "Mas a única coisa em que praticamente todo
cientista concorda hoje é que o aquecimento que estamos vendo é impulsionado
pela queima de combustíveis fósseis."
Por que
demorou para se chegar a essa conclusão?
Uma análise amplamente discutida sobre a evolução do consenso científico
sobre o aquecimento global antrópico foi publicada em 2013.
Liderado por John Cook, pesquisador do Centro de Pesquisa de Comunicação
sobre Mudanças Climáticas da Universidade de Monash, na Austrália,
pesquisadores americanos, britânicos e canadenses examinaram 11.944 textos
relacionados ao clima publicados na literatura científica revisada por pares
entre 1991 e 2011.
Menos de 1% dos trabalhos de pesquisa examinados rejeitavam a ideia da
influência humana sobre o clima da Terra. Dos textos, 66,4% não expressaram
nenhuma posição sobre o fator antrópico, e 32,6% o endossaram. Uma análise mais
aprofundada desse último número revelou um consenso de 97,1% sobre a mudança
climática causada pelo homem.
Os críticos, no entanto, atacaram as conclusões com base no fato de que o
consenso de 97,1% foi derivado de menos de um terço (32,6%) de todos os artigos
revisados. A maioria (66,4%), argumentaram eles, não havia expressado um ponto
de vista.
O consenso científico não pode ser alcançado através de votação, mas
evolui com o tempo à medida que mais pesquisas são feitas.
Um estudo mais recente conduzido por um grupo de autores internacionais
confirmou que mais de 90% dos cientistas climáticos compartilham o consenso de
que a mudança climática é causada pelo homem.
E uma análise de 2019 de 11.602 artigos revisados por pares sobre mudança
climática publicados nos primeiros sete meses de 2019 constatou que os
cientistas chegaram a um acordo de 100% sobre o aquecimento global causado
pelos humanos. Essa pesquisa foi realizada por James Lawrence Powell, geólogo
americano e autor de 11 livros sobre mudanças climáticas e ciência da Terra.
"Se uma teoria alternativa do que está impulsionando a mudança
climática em vez de gases de efeito estufa fosse apoiada por pesquisas e
evidências, tal trabalho seria inovador", diz Benjamin Cook. "Seria
um estudo de nível de prêmio Nobel. Mas nós não temos ainda essa
pesquisa."
A mudança climática de origem humana é endossada pelo IPCC. Já em 1995, o
órgão intergovernamental disse: "O equilíbrio das evidências sugere que
existe uma influência humana discernível sobre o clima global."
"Uma abordagem científica significa olhar para os dados, observações
e resultados para tirar conclusões", afirma Helene Jacot Des Combes,
climatologista da Universidade do Pacífico Sul, autora do IPCC e assessora do
governo das Ilhas Marshall. "E tudo isso nos diz que a atual mudança
climática é causada pelas atividades humanas."
Por Tatiana
Kondratenko, Deutsche Welle
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