O Ministério
Público Federal em São Paulo (MPF/SP) denunciou 32 pessoas por desvios de cerca
de R$ 21 milhões em recursos públicos do Ministério da Cultura (Minc), obtidos
por meio da Lei Rouanet, mas que não foram aplicados conforme a lei. A Operação
Boca-Livre - deflagrada pelo MPF, pela Controladoria-Geral da União (CGU) e
pela Polícia Federal em 2016 - concluiu que parte do dinheiro foi desviada pelo
grupo Bellini Cultural, com conhecimento das empresas doadoras, para eventos
privados, como shows e publicações corporativas, e, inclusive, para o casamento
de um dos sócios do grupo em Jurerê Internacional, em Florianópolis.
Segundo o MPF, a
investigação começou em 2011, quando o órgão recebeu uma denúncia anônima,
apontando fraudes cometidas pelo grupo Bellini Cultural, dirigido por Antonio
Carlos Bellini Amorim, que afirmava que sua empresa era a quinta maior
arrecadadora de recursos do Ministério da Cultura. Os fatos foram comunicados
para o Minc, que, em 2011, tinha um passivo de 88% das prestações de contas de
projetos culturais pendentes, segundo o TCU.
Em 2013, a CGU
exigiu que o Ministério da Cultura fiscalizasse os projetos e o Minc bloqueou
repasses para duas empresas do grupo Bellini, que passou então a diversificar a
apresentação dos projetos, para burlar a fiscalização, terceirizando-os entre
empresas de funcionários e emitindo notas frias por meio de empresas de
funcionários ou laranjas, por exemplo.
As fraudes do grupo
Bellini, conforme o MPF, dividiam-se em cinco modalidades: superfaturamento;
elaboração de serviços e produtos fictícios; duplicação de projetos; utilização
de terceiros como proponentes e contrapartidas ilícitas às empresas
patrocinadoras. Enquanto isso, os desvios aumentavam e dinheiro de projetos
culturais foram usados para o casamento de um dos filhos de Bellini, Felipe, na
praia de Jurerê Internacional, em Florianópolis.
Contrapartidas ilegais
As contrapartidas
ilícitas consistiam na publicação de livros corporativos, para serem dados de
brindes para empresas parceiras e clientes, quando os projetos afirmavam que os
livros seriam distribuídos gratuitamente e apenas uma pequena parte seria
entregue às empresas; na realização de shows privados de fim de ano com
artistas renomados e na devolução de dinheiro à empresa patrocinadora.
Por esses crimes,
diretores do grupo e colaboradores estão sendo acusados pelo MPF por
organização criminosa, estelionato contra a União e falsidade ideológica.
Em todos os
projetos do grupo Bellini Cultural investigados, o MPF entendeu que diretores
das empresas patrocinadoras concorreram para a prática de estelionato contra a
União, uma vez que as empresas, conforme a Lei Rouanet, por terem doado
dinheiro para os projetos culturais, tiveram abatimento do seu Imposto de
Renda. Ao receberem a contrapartida indevida, lucravam triplamente, pois, além
da redução no Imposto de Renda, realizam seus eventos corporativos, de fato,
com dinheiro público, e ainda divulgavam suas marcas para clientes.
Enquanto isso,
cidades de interior e periferias das grandes cidades ficavam privadas de
atividades culturais e bibliotecas públicas não recebiam os livros que
supostamente deveriam receber. O máximo que recebiam eram o que os diretores da
Bellini classificavam de "contrapartida social", a apresentação de
uma orquestra, geralmente de dia, no mesmo local em que seria realizado o show
corporativo à noite, ou uma pequena fração dos livros, distribuídos de forma
completamente aleatória. Ou seja, a Lei Rouanet era desvirtuada pela Bellini e
pelas empresas patrocinadoras.
A denúncia do MPF,
de autoria da procuradora da República Karen Kahn, está sendo apreciada pela 3ª
Vara Federal de São Paulo, que determinou a realização da Operação Boca-Livre,
em junho do ano passado, realizada após quatro meses de interceptação telefônica,
que comprovou o que as autoridades investigavam. A maioria dos acusados admitem
os crimes, mas, em sua defesa, afirmam que as contrapartidas ilegais eram
práticas comuns do mercado cultural.
Diário Catarinense
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