A exposição Carolina Maria de Jesus: um Brasil para os brasileiros, com abertura em 18 de setembro, apresenta a vida, a obra e o legado da escritora, além de ressaltar aspectos pouco conhecidos de sua trajetória.
Com entrada gratuita, a mostra será realizada no
Instituto Moreira Salles, localizado na capital paulista.
Resultado de uma pesquisa de quase dois anos, a
seleção reúne cerca de 300 itens, entre fotografias, manuscritos, matérias de
imprensa, vídeos e outros documentos. Além disso, haverá obras de cerca de 60
artistas que dialogam com a produção de Carolina de Jesus (1914-1977).
As reflexões da escritora ao longo de sua trajetória
estão presentes na mostra, da infância na cidade de Sacramento (MG), no
contexto pós-abolição da escravatura, passando por sua chegada à cidade de São
Paulo, pelo lançamento e pela repercussão de seus livros, até o fim de sua
vida, em Parelheiros (SP).
Segundo os organizadores, na seleção, o público poderá
observar como Carolina interpretou as contradições, a política e a desigualdade
do país. A exposição, em cartaz até janeiro de 2022, demonstra a importância
histórica da autora para lutas como antirracismo, pelo letramento e pela
moradia.
Os textos de Carolina e sua própria letra aparecem em
diversos formatos na exposição, como manuscritos, projeções na parede e
lambe-lambes. Durante a pesquisa, foram consultados os originais da autora,
grande parte localizados no Arquivo Público de Sacramento. O objetivo é mostrar
ao público a produção original da escritora, após seus livros publicados
sofrerem modificações.
“Carolina tornou-se um símbolo de resistência para os
movimentos negros contemporâneos, referência para vertentes do feminismo negro,
para a literatura de autoria negra e periférica. Um ícone de um Brasil
insubmisso, que colocou em xeque um projeto de modernidade excludente, que era moldado
quando a autora lançou seu primeiro livro’”, afirma a equipe de curadoria.
A curadoria é do antropólogo Hélio Menezes e da
historiadora Raquel Barreto, com assistência da historiadora da arte Luciara
Ribeiro e trabalho de pesquisa da crítica literária e doutora em letras
Fernanda Miranda.
Manuscritos
O título da mostra, Um Brasil para os brasileiros,
refere-se a dois cadernos originais da escritora, que estão sob a guarda do IMS
desde 2006. Em 1975, Carolina entregou os manuscritos à pesquisadora Clélia
Pisa, que, juntamente a Maryvonne Lapouge, a entrevistou para o livro
Brasileiras, publicado na França.
Depois da morte de Carolina, os cadernos foram
editados naquele país e publicados em livro, em 1982, com o título Journal de
Bitita, que foi traduzido e lançado em português como Diário de Bitita, em 1986.
No processo de edição dos manuscritos, houve alterações no texto da autora,
como a mudança do título original, Um Brasil para os brasileiros.
Os manuscritos são o fio condutor da mostra e serão
exibidos logo na entrada, conforme apontam os organizadores.
“Em Um Brasil para os brasileiros, a autora elabora
narrativas biográficas e autoficcionais ao rememorar sua infância, apresentando
pontos de vista de personagens que foram apagadas das narrativas oficiais
escritas, majoritariamente por autores homens e brancos. Carolina faz assim um
interessante contraponto aos cânones literários vigentes no Brasil”, explica a
equipe de curadoria sobre a importância do livro.
Além de percorrer a produção literária de Carolina, a
exposição apresenta fotografias pouco conhecidas. Há, por exemplo, um registro
dela no aeroporto, em 1961, antes de embarcar para o lançamento de Quarto de
despejo, no Uruguai. Em outras fotos, ela aparece em programa de televisão com
os filhos, em 1962, e usando um vestido que confeccionou para o carnaval de
1963.
“Ao reunir essas fotografias, a exposição procura
apresentar uma nova visualidade da autora, em contraponto às imagens mais
difundidas, que a retratam quase sempre de modo perfilado, com uma expressão
por vezes séria e cabisbaixa e os cabelos cobertos por um lenço, que acabou se
tornando um símbolo associado à escritora”, explicam os organizadores.
A mostra aborda ainda a relação de Carolina com a
imprensa. A pesquisa curatorial revelou que a escritora teve sua primeira
publicação em jornais na década de 1940, quase 20 anos antes da famosa matéria
sobre a escritora do jornalista Audálio Dantas. Além disso, há reportagens
publicadas em veículos como O Cruzeiro, Folha de S. Paulo, Última Hora e New
York Times.
A obra de Carolina teve repercussão também no cenário
internacional. O livro Quarto de despejo foi traduzido para outros idiomas e a
exposição terá exemplares de edições internacionais da obra, mostrando como a
produção da autora chegou a leitores em diversas partes do mundo.
Além de sua obra literária, Carolina compunha canções,
cantava, tocava violão e costurava, facetas que também serão apresentadas na
mostra. Em 1961, um ano depois de lançar Quarto de despejo, ela gravou o disco
homônimo, com músicas de sua autoria. O raro LP, que pertence ao Acervo José
Ramos Tinhorão, sob a guarda do IMS, estará em exibição. O público também
poderá ouvir as canções do álbum, que tratam do cotidiano e das relações de
classe e gênero.
Para visitar a exposição, é preciso fazer agendamento prévio pela
internet. O Instituto Moreira Salles, local da exposição, fica na Avenida
Paulista, 2424.
Agência Brasil
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