Escola pública em Ologa, na Venezuela, em foto de 6 de setembro. Cidade tem índice baixíssimo de alfabetização. — Foto: Federico Parra/AFP |
Em Ologá, escola fechou as portas antes mesmo da pandemia começar. Além da má instrução, faltam infraestrutura e acesso a serviços básicos.
As carteiras do que no passado foi uma escola em Ologá, um povoado de
pescadores isolado na Venezuela, estão amontoadas há quatro anos em uma sala
escura e empoeirada. O quadro negro não tem nada escrito e a tinta descola das
paredes por causa da umidade.
A escola funcionava em uma modesta construção com janelas enferrujadas em
uma ilhota deste empobrecido assentamento de palafitas no Lago de Maracaibo.
Estava fechada havia três anos quando o governo do presidente Nicolás
Maduro suspendeu as aulas presenciais em março de 2020 por causa da pandemia de
Covid-19. E agora que o governo prevê reabrir as salas de aula em 25 de
outubro, o retorno não será possível.
Esta é uma das tantas calamidades de Ologá, onde vivem umas 40 famílias
sem água encanada, nem eletricidade, praticamente isoladas pela falta crônica
de gasolina, assim como muitos casarios nesta região que viu nascer a indústria
petroleira venezuelana.
Paradoxalmente, a única professora que viajava para este remoto povoado
para dar aulas começou a se ausentar devido à falta de combustível. Ela
dependia de caronas dadas pelos pescadores e barqueiros que levavam turistas
para a região — famosa pelo fenômeno conhecido como Relâmpago do Catatumbo —
até que um dia não voltou mais.
Isso sem contar com os salários baixos, que não chegam aos 5 dólares por
mês, uma realidade que se repete em todo o país.
"Não aprendi a ler (...) e nada de vogais", conta com voz
anasalada e palavras entrecortadas Andrea, uma menina de 12 anos, que lembra dos
colegas no recreio, quando brincavam em um balanço confeccionado com tábua e
cordas, pendurado entre os galhos das árvores frutíferas que outros escalavam.
A taxa de alfabetização na Venezuela é superior a 97%, segundo a Unesco,
mas neste casario salpicado por manguezais, o fechamento da escola só piorou o
analfabetismo dominante.
"Dos meus oito filhos (já adultos), só uma sabe ler e escrever. Os
demais somos todos ignorantes", comenta à AFP Ángel Villasmil, de 58 anos,
que se prepara para lançar sua velha rede para pescar a alguns metros de uma
praia onde passou toda a sua vida.
Enquanto desenrola a rede de pesca, vê seus 20 netos brincando com tábuas
e tambores de plástico que flutuam em uma margem repleta de dejetos arrastados
pela correnteza, a maioria cobertos de petróleo. Nenhum deles sabe ler ou
escrever.
'Nossos
pulmões doem!'
Maria Villasmil, filha de Ángel, lembra de seus anos de colégio com
alegria. "A professora me ensinou muitas coisas, ler, escrever", diz
esta mãe de 21 anos.
"Quero que a minha filha também aprenda. Aqui tem muitas crianças que
querem estudar e não podem fazê-lo porque não tem escola", assegura,
referindo-se à sua pequena Sheira, de três anos.
Mas em Ologá, a falta de educação está longe de ser o problema principal.
Ángel, que não estudou, embora a escola funcionasse em sua época, entra todos
os dias no lago tentando pescar alguma coisa para vender e alimentar sua
família.
Francisco Romero, nascido há 67 anos neste povoado flutuante, garante que
"nestes tempos a vida tem sido dura".
"Não temos eletricidade, água bebemos quando chove, de resto temos
que buscar água no rio", comenta em sua palafita feita de paredes de latas
desmontadas, onde mora com outros nove familiares.
A fumaça da lenha usada para cozinhar impregna o ar. Há anos não têm
acesso ao gás doméstico. "Nossos pulmões doem!", exclama.
O pouco combustível que chega é levado pelos compradores de peixe, que
costumam pagar por escambo com gasolina ou "um pouco de comida", em
especial arroz ou farinha de milho.
Muitos foram "para terra pôr os jovens no colégio", diz
Francisco, mas a crise os obriga a voltar.
"Vão embora e voltam outra vez para cá, a vida em terra não é igual à
daqui, a gente tira o peixe e come, mas em terra se você não tem um 'bolivita'
(moeda), não come", explica.
France Presse
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