segunda-feira, 24 de novembro de 2014

A estrutura cênica do Teatro de Bonecos Mané Beiçudo

O teatro de bonecos Mane Beiçudo é uma metodologia que encerra inúmeras apresentações em um só contexto. São realizadas:

1. apresentações de bonecos de luva, abrigados dentro de uma empanada. Essas apresentações – quando das caminhadas de mobilização (os Espetáculos-mestes) – ocorrem em diversos pontos do trajeto, razão porque a empanada vai sendo deslocada de um lugar para outro, conforme a programação previamente elaborada. São os Espetáculos-satélites.
2. apresentação dos bonecos gigantes no grande teatro de rua que ocorre acompanhando a caminhada de mobilização. É o conceito do Espetáculo-mestre.

a. A empanada

A cabana que abrigará os atores-manipuladores pode ser erguida sustentada por uma estrutura de bambu, madeira, alumínio ou metalon. Esta estrutura é envolta por pano opaco que não permitem que a platéia perceba o que se passa em seu interior – as empanadas. O fundamental é que seja assegurada privacidade aos atores, que – em hipótese alguma – poderão ser vistos enquanto manipulam, brincam com os bonecos. Isto quebraria a magia do espetáculo.

Importa também construir a estrutura com o material mais leve, facilitando o manuseio e transporte. O ideal é que as peças da estrutura apresentem nas extremidades um sistema de pontos de encaixe, contribuindo para que o processo de montagem e desmontagem se dê com simplicidade e a necessária rapidez.

b. Os integrantes do teatro de luva do Mane Beiçudo

Dentro da empanada atuarão o manipulador principal, o mestre e dois ou três auxiliares - conforme seja o número de bonecos exigido na peça. Os auxiliares recebem a denominação de contramestres.

Do lado de fora da empanada atuam

• o conjunto de músicos, geralmente um percursionista e um violeiro ou sanfoneiro;
• o palhaço Serelepe, personagem que faz a ponte entre a platéia e os atores, passa dicas e informações cifradas para os manipuladores, responde e provoca tanto os bonecos como o público e faz a praça, recebendo a contribuição financeira da platéia. No Teatro Mamulengo recebe a denominação de Mateus, e no Teatro João Redondo, de Arrelinquim.

c. O teatro de rua

Na sistemática de produção do Teatro Mané Beiçudo, em diversos momentos ocorre a necessidade de promover mobilizações político-culturais. Essas mobilizações podem assumir a forma de caminhadas, passeatas, reuniões públicas numa praça ou logradouro ou ainda, podem assumir a forma de mega apresentações teatrais, realizadas em grandes eventos como na abertura de shows musicais ou de importantes partidas do campeonato de futebol.

Nestas oportunidades é que serão realizadas as apresentações de teatro de rua, com a utilização dos bonecos gigantes. É a categoria que aqui denominamos Espetáculo-mestre.

Como o teatro de rua acontece num grande espaço, ao ar livre, tudo deve ser exagerado. A performance, os movimentos e os gestos dos atores devem ser largos, grandiosos; a voz deve apresentar volume e impostação adequados; os adereços e objetos cênicos bastante expressivos e visíveis; os bonecos, de dimensões agigantadas, a maquilagem exagerada e a indumentária multicolorida.

Antônio Carlos dos Santos, criador da metodologia de Planejamento Estratégico Quasar K+ e da tecnologia de produção do teatro popular de bonecos Mané Beiçudo.

terça-feira, 18 de novembro de 2014

Todo mundo de volta ao teatro



Yolanda Barrasa ensaia com os atores de 'A sós'. / Divulgação
 
O microteatro, formato inovador criado na Espanha em 2009, chega ao Rio para impactar

Por Camila Moraes, no El País
 
Como trazer de volta ao teatro o público que o cinema comercial, a televisão e outros tipo de entretenimento tecnológicos e massivos desviaram das artes cênicas nos últimos tempos? A resposta, ao contrário do que se pensa, pode ser simplificar o espetáculo, em lugar de complicá-lo com pirotecnias.

Essa foi a experiência que viveu a espanhola Yolanda Barrasa e outros criadores do microteatro, um formato teatral inovador que nasceu em 2009 em Madri, dentro dos pequenos quartos de um prostíbulo abandonado. A proposta, como já foi dito, é simples: reduzir a duração da obra, a quantidade de atores em cena e de espectadores na plateia e o espaço disponível para a encenação. Assim, com três atores, 15 espectadores, 15 metros quadrados e 15 minutos de peça no máximo, nasceu uma experiência teatral que pode ser comparada ao conto na literatura e ao curta-metragem no cinema. Uma história com um punch, feita para impactar.

A novidade acaba de aterrissar no Rio de Janeiro, trazendo da Espanha e dos vários microteatros que se espalharam pelo mundo (mais de 100) a exigência de que cada encenação se repita várias vezes numa mesma noite, para que o público escolha ao que assistir. O lugar escolhido foi o Castelinho do Flamengo, onde o microteatro carioca, com várias peças curtas apresentadas ao mesmo tempo, ficará instalado por quatro semanas (de 14 de novembro a 6 de dezembro). A entrada às sessões que acontecerão sempre às sextas e sábados é gratuita.

“Foi a forma que encontramos de reconquistar o espectador e de atrair um público distinto ao que frequenta hoje em dia o teatro tradicional. Em Madri, onde fundamos um microteatro permanente, chegamos a encenar a mesma peça 20 vezes numa noite, com um público que misturava adolescentes e idosos, entre outras pessoas”, conta Yolanda sobre o Microteatro Por Dinero – referência mundial desse tipo de “teatro íntimo, que valoriza os detalhes e os sussurros”, como explica a própria diretora, responsável por uma montagem brasileira da micropeça A solas (a sós), de Lorenzo Silva, sobre um interrogatório entre um homem e uma mulher.

Não só Yolanda e seus companheiros reconheceram essa democratização do público, como que tinham revitalizado o formato teatral. Isso se deve, principalmente, à experiência de um teatro simultâneo, que implica que o espectador escolha livremente suas obras preferidas. “O teatro curto existe desde Cervantes, mas essa proposta dinâmica e democrática foi para nós o surgimento de algo insólito. É uma grande emoção ver que o formato foi amplamente adotado”, diz.

A ideia de um microteatro carioca surgiu casualmente, quando Yolanda veio ao Brasil para dar um dos workshops extramuros da Escuela de Cine y Televisión de SanAntonio de los Baños, de Cuba. Depois da estreia no Rio, é possível que se abra uma temporada em São Paulo e em Curitiba, mas por hora nada está confirmado. Só que o show vai durar 15 minutos, com três atores, 15 pessoas na plateia... E que pretende emocionar.

segunda-feira, 25 de agosto de 2014

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O ventríloquo e o teatro de bonecos Mané Beiçudo


Quem transita nas médias e grandes cidades não mais se surpreende quando, numa praça ou logradouro público, se depara com um aglomerado de gente.

Não é raro encontrar um amontoado de pessoas, atentas ao que se passa no centro da roda. Das duas, uma: ou é um encantador de serpentes, assustando todos com sua caixa escura repleta de cobras peçonhentas; ou é um animado senhor que, de forma encantadora, conversa, discute e briga com um boneco histriônico que carrega no colo, sentado sobre a perna.

No circo e nas praças dos núcleos urbanos, com relativa facilidade nos deparamos com essas aglomerações humanas, um amontoado de curiosos tendo no centro um ventríloquo.


Com a utilização desta tecnologia, o ator apresenta-se, geralmente, sentado em um banco ou cadeira, mantendo sobre seu colo um boneco, com quem brinca e conversa, provocando-o de forma acintosa e contundente e recebendo do boneco apimentadas réplicas e tréplicas. À medida que fala, dando mínimos movimentos aos seus lábios, o manipulador mexe a boca do boneco, com o que lhe empresta voz e vida. Para executar este movimento de abrir/fechar a boca do boneco, um mecanismo interno é acionado pelo ator.

O teatro de bonecos Mané Beiçudo raramente utiliza-se desta tecnologia. Dado a plasticidade e as características intrínsecas da tecnologia, prioriza os bonecos de luva, notadamente os confeccionados com sucata, com o que empresta um sentido educativo até mesmo à rotina de fabricação dos títeres.

Antônio Carlos dos Santos - criador da metodologia dePlanejamento Estratégico Quasar K+ e da tecnologia de produção do Teatro Popular de Bonecos Mané Beiçudo.acs@ueg.br

domingo, 17 de agosto de 2014

A linha de produção do Teatro de Bonecos Mané Beiçudo

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(...)
Humilhas, avanças, provocas, agrides, espancas, torturas, aprisionas indefesos – e quem bate e violenta é a tropa de choque?
Te tornaste carne, sexo e prostituta de incubo de Saturno –
e ensandecidamente acusas o outro de estupro? (...)

Leia o poema Uma oração para canalhas clicando aqui.
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Em seu processo produtivo o Teatro Mané Beiçudo não se limita ao instante da apresentação teatral. Não se contenta com a efemeridade deste lapso temporal.

Num espetáculo convencional as pessoas chegam ao teatro – ou ao local demarcado – acomodam-se, assistem a apresentação cênica, aprovam aplaudindo, se mantêm indiferentes ou reprovam, vaiando, e depois se retiram para o conforto de seus lares. E acabou. Quando muito, nos dias seguintes, um ou outro comentário no local de trabalho ou de estudo. E pronto, acabou.

Já utilizando a metodologia do Mané Beiçudo, o instante da apresentação demanda pelo menos duas semanas. No mínimo minimórum.

Considerando esta possibilidade mínima: nos sete dias anteriores à apresentação propriamente dita, os atores mergulham na comunidade, interagem com o público-alvo, com os

• moradores, se o espaço-objeto for um bairro;
• estudantes, se o espaço-objeto for uma escola;
• trabalhadores, quando o espaço-objeto é uma organização governamental ou não.

Neste primeiro momento, denominado Fábrica Ex-Ante, os atores e produtores colhem subsídios, realizam pesquisas, aplicam questionários, recolhem, tabulam e tratam os dados transformando-os em informações, resgatam os valores e tradições culturais locais, estruturam a coluna dorsal do texto a ser apresentado, identificam dentre as pessoas da comunidade os potenciais atores, promovem uma oficina compacta onde repassam a metodologia do Teatro de Bonecos Mané Beiçudo – para que o processo possa ter continuidade local – e ensaiam o espetáculo.

No segundo momento, denominado Fábrica Ex-Cursus, a apresentação do espetáculo é realizada no local definido, um teatro, uma sala de aula, um refeitório de uma unidade fabril, o hall de uma repartição pública, um logradouro público... Logo após a realização do espetáculo, ocorrem debates, oportunidade em que os atores procuram estabelecer relações entre a ficção e a realidade local. Um questionário é aplicado entre os presentes, material que servirá de subsídios para a elaboração do Documento “Diagnóstico e Diretrizes para a Produção Cultural Local”.

Ainda neste momento, a opção pode ser pelo Espetáculo-mestre e pelos Espetáculos satélites. O primeiro é uma grande marcha carnavalesca, uma grande passeata cultural que objetiva mobilizar a comunidade. Os Espetáculos satélites ocorrem no decorrer da passeata cultura, no interior do Espetáculo-mestre.

O terceiro momento, a Fábrica Ex-Post, é reservado para a avaliação de todo o processo e ao reprocessamento, à retroalimentação, para que a roda não pare, e continue girando de uma forma sempre melhor. Problemas são identificados e equacionados, soluções apontadas, medidas e deliberações com vistas a correções de curso são adotadas. Isto em nível do espetáculo propriamente dito como também em nível dos problemas objetivos que assolam a comunidade: inexistência de esgotamento sanitário; questões de saúde como o aumento descontrolado da dengue e do calazar; problemas urbanos como a falta de moradias, o transporte coletivo deficiente, o lixo doméstico, industrial e hospitalar, etc. e etc. O processo então é retroalimentado, a roda volta a rodar, mas agora com um upgrad, com um plus, com um diferencial de acréscimo positivo. Este ciclo se repede ad-eternum. Por isto o espetáculo é um processo permanente.

Antônio Carlos dos Santos - criador da metodologia Quasar K+ de Planejamento Estratégico e da tecnologia de produção de Teatro Popular de Bonecos Mané Beiçudo.acs@ueg.br