quarta-feira, 27 de novembro de 2019

Cultura, Educação & Teatro Popular


O teatro Mané Beiçudo se nutre de cultura popular. Mas não a enxerga com o olhar enviesado dos idealistas ingênuos, dos que a definem como “um conjunto de tradições” ou como “expressão autônoma do temperamento do povo”.

O que comumente se denomina ‘cultura popular’ está impregnado dos valores, paradigmas e estética disseminados pela mass mídia. De modo que a “criação espontânea do povo”, a “memória convertida em arte” apenas expressa e reforça os ideários homogêneos dos setores dominantes. E como é característico da lógica econômica que permeia todo o pensamento globalizado, tudo é estandardizado e pausterizado. E as famílias, a escola, os meios de comunicação, as instituições tratam de assegurar e referendar o stablisment.

No Teatro Mané Beiçudo a cultura é situada mais como um instrumento que possibilita trabalhar a realidade, desnudando-a, entendendo-a, para que se possa reproduzi-la ou reprocessá-la, de modo a obter – sempre – um dia melhor que o anterior.

Em seus “Escritos sobre teatro”, Bertolt Brecht escreve:

“Popular é o que as grandes massas compreendem
o que documenta e enriquece a sua forma de expressão
é o que incorpora e reafirma o seu ponto de vista
é aquilo que é tão representativo da parte mais progressista do povo, que pode se encarregar da sua direção e tornar-se também compreensível para os demais setores sociais
é o que, partindo da tradição, a leve adiante (...)”.

As políticas públicas atuam no sentido de assegurar a supremacia do mercado, que dá à cultura popular outras formas e significados. A aposta é na expansão do turismo e na afirmação dos princípios ideológicos. Neste sentido, o Teatro Mané Beiçudo – TMB - é plena reação, antítese e contraponto. Insurge-se contra o status quo procurando criar espaços onde a diversidade cultural seja possível, se manifestando com seus múltiplos e ricos conflitos, em toda a sua intensidade; por que é desta relação que a cultura local encontra campo para se afirmar.

Daí que o conceito de participação comunitária no TMB caminha de forma indissociável das condições objetivas para que esta participação se efetive na prática, no dia a dia. E só a educação pode estabelecer esta ligação e responder a este desafio. Não basta, portanto, simplesmente instituir e abrir canais de comunicação e participação. Em países onde as desigualdades latejam como no Brasil, estas iniciativas apenas conduzem à cooptação de lideranças comunitárias, ao emparelhamento dos órgãos colegiados e das organizações da sociedade civil, ao mesquinho populismo político. Tão importante quanto institucionalizar os canais de participação comunitária é assegurar condições para que a população a exercite. E sem a universalização da educação de qualidade, tudo isto se dilui na efemeridade de um sonho fugaz e passageiro.

Portanto, o grande desafio é garantir educação de qualidade para todos. Não sendo assim, a comunidade estará determinada a reprocessar a realidade sempre à luz dos interesses alheios. E o pior: imaginado que o faz à luz de seus próprios interesses.

Para se obter uma participação consentânea com as reais necessidades, a população deve se apropriar do saber, do conhecimento, da capacidade de exercer a reflexão crítica,... Só assim terá condições de acessar os códigos capazes de desvendar os enigmas propositalmente mantidos indecifráveis, códigos escondidos em cofres que pretendem indevassáveis.

Antônio Carlos dos Santos - criador das tecnologias Quasar K+ de Planejamento Estratégico e da metodologia de produção de teatro popular de bonecos Mané Beiçudo.



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