Dona Alayde nunca teve medo da cidade grande. Nasceu em Terenos, mas sempre
sonhou em morar na Capital. Viveu quase a vida toda na fazenda, na lida diária,
no chão batido. Quando partiu, no dia 27 de maio do passado, deixou para os
três filhos não só a alegria e a vaidade de quem até para se internar no
hospital precisava do cabeleireiro, mas também o amor pela leitura e a escrita,
herança da época em que foi impedida de estudar e o melhor bolo de mandioca do
mundo.
“Ela cresceu semi-analfabeta, aprendeu a ler sozinha. Ela me contava que na
fazenda onde morava, tinha um lugarejo próximo com uma escola. Todos os anos
ela pedia para ir, assistir as aulas. Quando alcançou uma idade, ela percebeu
que jamais iria para a escola e tentou aprender sozinha, pegando os livros dos
irmãos que já tinham estudado”, relembra a filha do meio de Dona Alayde,
Valdeci Santos do nascimento, 52 anos.
Esse desejo de aprender nunca abandonou Dona Alayde. Lutou para morar na
cidade, dar uma vida melhor aos filhos, mas ainda casada, preferiu ficar ao
lado do marido na lavoura. “Ela incutiu na minha cabeça e na dos meus irmãos
que a melhor forma de ascendermos e termos melhores condições de vida seria
através da dedicação ao estudo. Acabamos pagando um preço alto por isso,
principalmente ela, que viu os filhos pequenos morando, de favor, em casas
alheias”, relembra.
Valdeci diz que mesmo assim nunca viu a mãe desanimar. Trabalhou como
lavadeira, faxineira, cozinheira e continuou incentivando que os filhos jamais
desistissem de uma vida melhor. Quando ficou viúva, há 18 anos, preferiu seguir
os passos dos filhos. Aos 79 anos, morava sozinha, gostava de levantar cedo e
pagar as contas, seguir com a rotina todos os dias.
Até que um dia o câncer de pâncreas foi descoberto. Para Valdeci, ainda é difícil
aceitar. “Foi como se tivesse perdido minha mãe em um acidente. Ela sempre foi
independente, morava sozinha, de repente começou a se sentir mal e 29 dias
depois faleceu.
Não esperávamos um desfecho tão trágico. Não éramos melhores amigas, mas eu era
a pessoa de confiança dela, em todos os sentidos e ela era a minha. Minha mãe
batalhou por nós. Deixou em nós esse desejo de ser sonhadores e de procurar até
o fim a nossa felicidade”, diz.
Foi no final da tarde do dia 27 de maio do ano passado, que dona Alayde se
despediu. Com a filha ficou o jeito vaidoso, “ela exigiu a presença de
cabeleireiro e manicure para chegar ao hospital apresentável, como gostava de
dizer”, ri Valdeci.
A receita de bolo de mandioca e o arroz soltinho ainda são lembrados nas festas
familiares, assim como a forma batalhadora de ver a família. Hoje, a mãe
completaria 80 anos, mas para os filhos, Valdeci, Francisco Luis do Nascimento,
o vereador Saci, e Maria Irene Mendes Flores, isso não é motivo de tristeza,
mas ainda de comemoração. “Aqui deixou uma família harmoniosa e estabilizada.
Dois netos e três bisnetos. Acredito que ela cumpriu a missão de quem sonhou um
destino diferente e melhor para os seus”.
Por Naiane Mesquita, no Campo Grande
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