Foi sancionada em
29 de novembro a Lei 13.364, que eleva o rodeio, a vaquejada e as respectivas
expressões artístico-culturais à condição de manifestações da cultura nacional
e de patrimônio cultural imaterial.
Consideram-se, ainda, patrimônio cultural imaterial
do Brasil as expressões decorrentes, como montarias, provas de laço, apartação,
bulldog, provas de rédeas, provas dos três tambores, team penning e work
penning, paleteadas e outras provas típicas, como a queima do alho e o concurso
do berrante, bem como apresentações folclóricas e de músicas de raiz.
Numa leitura isenta
de qualquer valoração cultural subjetiva, o que é essencial, já que temos um
país com uma grande diversidade cultural e todas elas devem ser respeitadas,
algumas questões devem chamar a atenção da população sobre o tema. Uma primeira
observação a respeito do texto é que o assunto é objeto de lei federal,
portanto, aprovada no âmbito das duas Casas Legislativas (Câ- mara dos
Deputados e Senado Federal), com sanção presidencial e com a assinatura de um
único ministro, o da Justiça (Alexandre de Moraes). Curioso uma lei que eleva
os temas a manifestação da cultura nacional e de patrimônio cultural imaterial
não tenha acompanhamento e assinatura do ministro da Cultura. Uma segunda observação
seria a de analisar os efeitos dessa declaração.
A Lei Rouanet (Lei
8.313/91) considera as iniciativas de patrimônio cultural (artigo 25, VII) como
enquadráveis para efeitos de benefícios fiscais, com um detalhe adicional: as
ações de “preservação do patrimônio cultural material e imaterial” se enquadram
no artigo 18 da referida lei, que permite às empresas a dedução de 100% do
valor aplicado do Imposto de Renda em projetos desse tipo. Desde novembro
estaria permitido um projeto de realização de um rodeio, por exemplo, com o
enquadramento mais benéfico da Lei Rouanet (o outro enquadramento, do artigo
26, permite o abatimento parcial do valor aplicado).
Tal medida põe em
xeque a decisão de fevereiro de 2016 do Tribunal de Contas da União (TCU),
órgão ligado ao Poder Legislativo, que recomendou ao Ministério da Cultura a
adoção de providências para revisão de benefícios aos projetos “com potencial
lucrativo” ou de alto retorno econômico. O mesmo Legislativo aprova, então, uma
lei ampliando benefícios para uma categoria de projetos altamente rentável (ou
não teria forte potencial lucrativo a realização de um rodeio?).
Incrível que haja
uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) na Câmara dos Deputados
questionando a Lei Rouanet e que grande parte da confusão sobre o uso de
incentivo venha dessa profusão de leis que passam por nosso Legislativo, são
corroboradas pelo Executivo e fazem mais confundir o setor e a população do que
incentivar, de fato, as manifestações culturais. Calma, não acabou: a terceira observação
vem do julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 4.983 do
Supremo Tribunal Federal (STF), que em outubro de 2016 considerou
inconstitucional a Lei 15.299/2013, do Ceará, que regulamentava a vaquejada
como prática desportiva e cultural no Estado.
Os ministros
entenderam que há “crueldade intrínseca” aplicada aos animais, afirmando que o
dever de proteção ao meio ambiente, previsto no artigo 225 da Constituição
federal, se sobrepõe aos valores culturais da atividade desportiva. O ministro
relator, Marco Aurélio Mello, afirmou que laudos constantes no processo
demonstram consequências nocivas à saúde dos animais, bois e cavalos, como
fraturas, ruptura de ligamentos, comprometimento da medula óssea e outros
danos. Ainda que profissionalizada, no entendimento da maioria dos ministros a
prática oferece riscos aos animais.
Assim, o STF
entendeu que o termo “crueldade”, constante no inciso VII do parágrafo 1.º do
artigo 225 da Constituição federal, equipara à tortura os maus-tratos impostos
aos bois e cavalos durante a prática da vaquejada, sendo, portanto,
“intolerável a conduta humana autorizada pela norma estadual atacada”. A
vaquejada consiste numa competição em que vaqueiros montados a cavalo em duplas
tentam derrubar um boi, puxando o animal pelo rabo, de forma a imobilizá-lo
numa área demarcada do terreno. Entretanto, diferentemente do que era feito no
passado (a prática teve início no século 18), os bovinos são hoje
enclausurados, açoitados e instigados para que corram quando aberto o portão,
causando danos psicológicos comparados à tortura, bem como danos físicos sérios
quando estão na arena, visto que em velocidade são agarrados pelo rabo e
torcidos até cair com as quatro patas para cima, para serem dominado pelos
vaqueiros.
Existem três
projetos de lei federal (6.298, 6372 e 6505, todos de 2016) que tratam da
prática da vaquejada e visam, entre outras coisas, a proibir a crueldade com os
animais, prevendo, além da responsabilização cível e criminal de quem os
submete a tratamento cruel, a proibição de esporas e chicotes, o uso de
protetor de rabo do boi, a proteção de camada fofa de areia e a presença de
veterinário nos eventos. Serão suficientes essas medidas? E agora? Temos uma
boa polêmica estabelecida e pouco comentada pelos profissionais da área
cultural até o presente momento, mas que daria um excelente debate nacional,
diante das incongruências apresentadas. Precisamos, cada vez mais, que os
Poderes – Executivo, Legislativo e Judiciário – afinem sua comunica- ção, sob
pena de ficarmos dando passos para trás.
Por Aline Freitas,
Fabio Cesnik e Gregory Becher em O Estado de S. Paulo
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Luiz Carlos Prestes e Virgulino Lampião se
enfrentaram em combate no sertão, no interior do Nordeste? É o que afirmam
muitos pesquisadores.
A batalha teria acontecido entre as cidades de São
Miguel e Alto de Areias, no Ceará.
Se ainda hoje o sertão brasileiro é um poço de
miséria e iniquidades, nos anos de 1926 a realidade era ainda mais sombria.
Dominado pelos coronéis da política, pelos aristocratas
e latifundiários, no Brasil - de forma geral, e no Nordeste, em particular -
vicejavam a injustiça mais cruel, o analfabetismo embrutecedor, o clientelismo
político, a falta de oportunidades, a indigência e a miséria.
No agreste acorriam jagunços, pistoleiros e bandos
de cangaceiros que - ora por conta própria, ora contratados pelos poderosos
locais - irradiavam o terror, roubando, saqueando, extorquindo, sequestrando,
assassinando impunemente.
É neste contexto que surge Lampião e seu bando, o
mais famoso dentre todos porque o mais brutal, o mais longevo, o que adentrou o
imaginário popular como um híbrido de vilão e herói.
Lampião e seu bando torturaram, mutilaram,
sequestraram, saquearam, assassinaram... Tinham como hábito marcar com ferro
quente os rostos das mulheres que usavam saia ou cabelos curtos. Consta que, em
1923, na Paraíba, o senhor do sertão e 25 de seus cangaceiros estupraram
coletivamente a mulher do delegado de Bonito de Santa Fé.
Em 1926, temeroso da revolução propalada pelo movimento
tenentista, o governo alicia lampião, entrega a ele a carta-patente de Capitão,
e ao seu bando fardamento, armas e munição do exército nacional. Missão
atribuída? Combater a Coluna Miguel Costa-Prestes.
E Virgulino Lampião, de criminoso, cangaceiro e
bandoleiro, é tornado uma autoridade pública, um homem da lei.
Luiz Carlos Prestes representa um movimento que se
originou em 1922 com a Revolta do Forte de Copacabana e que se denominou
Tenentismo. O movimento político-militar compunha-se de oficiais de baixa e
média patente do Exército do Brasil: combatiam a velha República e suas
oligarquias; exigiam reformas políticas e sociais – sobretudo as eleitoral e do
ensino – e intentavam a derrubada do governo do presidente Artur Bernardes.
Fracassando em 1922, o movimento volta à carga em
1924: 6 mil militares tomam São Paulo e são derrotados pelo governo federal.
Essas tropas iniciam fuga em direção ao sul onde encontram as guarnições de
Prestes e dão origem à marcha histórica, a epopeia da Coluna Miguel
Costa-Prestes.
Quando partiu do Sul em direção ao Nordeste, a
Coluna Prestes constituía-se de um batalhão com 1700 homens armados com
artilharia pesada, fuzis, metralhadoras, canhões e bombas de alto impacto. O
cólera, as perdas em combate, o cansaço devido aos poucos cavalos, as
deserções... No confronto com Lampião, a Coluna mal chegava aos 600 soldados.
E Luiz Carlos Prestes, uma autoridade militar, um
tenente-coronel do Exército brasileiro, é tornado um renegado, um desertor, um
fora da lei.
É este contexto histórico que sustenta a peça
teatral “Lampião e Prestes em busca do reino divino: o dia em que o bandido
promovido a homem da lei guerreou contra o coronel tornado um fora da lei”.
Como se deu este combate? Como foi o encontro
entre Lampião e Prestes? De que trataram? Os cangaceiros tinham ideário
político? Conseguiram, Lampião e Prestes, chegar a algum entendimento?
Encontraram pontos convergentes em suas plataformas políticas e de ação?
Delicie-se leitor com essa literatura ficcional
ancorada em forte argumentação histórica.
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