quinta-feira, 7 de junho de 2018

Modelo da Ancine não pode ser interrompido


Diante do anúncio dos investimentos do Fundo Setorial do Audiovisual para 2018 para o desenvolvimento do setor —que envolve produção, distribuição e infraestrutura—, auditores da Secex-RJ (Secretaria de Controle Externo no Estado do Rio de Janeiro), do TCU, propuseram aos ministros do tribunal suspender as ações do fundo.

Entre os apontamentos elencados, estão a situação econômica do país e a capacidade da agência em fiscalizar os investimentos.

Os recursos do Fundo Setorial do Audiovisual são oriundos da própria atividade, por meio da Condecine (Contribuição para o Desenvolvimento da Indústria Cinematográfica Nacional). Não se trata de incentivos fiscais, mas de arrecadação de empresas do setor distribuidores, produtores e empresas de telecomunicação--, que constitucionalmente deve ser investida no incremento do mercado.



São contribuições sobre a comercialização de cada obra audiovisual (Condecine Título), sobre a remessa de lucros para o exterior pela exploração das obras (Condecine Remessa) e sobre a operação das empresas de telecomunicação (Condecine Teles).

Esses recursos impulsionam a atividade, gerando milhares de empregos, milhões em outros tributos federais, estaduais e municipais, além de contribuir diretamente para o Tesouro Nacional com em torno de 50% da Condecine entre os anos de 2009 e 2017, que foram retidos pela União.

O Fundo do Audiovisual atingiu um novo patamar a partir de 2015, alguns anos após a aprovação da Lei da TV Paga (lei 12.485/11), momento em que a agência colocou em curso novas práticas de acompanhamento e controle.

Amparada pelo decreto 8.281/14, em diálogo com a CGU (Controladoria Geral da União) e o TCU (Tribunal de Contas da União), a Ancine construiu um novo modelo para dar conta do passivo e do volume crescente de projetos de obras audiovisuais, realizado para atender à demanda por conteúdo brasileiro gerada pela Lei da TV Paga.

Nesse modelo, todos os projetos prestam contas à agência e têm suas contas analisadas.

A partir daí, é realizado um sorteio público para selecionar um percentual que recebe análise ainda mais detalhada, enquanto, paralelamente, todos os projetos são acompanhados durante a execução das obras, permitindo alertas aos proponentes quando pertinente. Esse é um modelo recente, em curso, que com certeza pode ser aprimorado, mas não interrompido, paralisando a agência e o setor.

Desde sua fundação, a Ancine conta com o TCU acompanhando anualmente seus procedimentos e recomendando ajustes. Surpreendeu-nos a divulgação na imprensa de apontamentos do órgão antes mesmo dos esclarecimentos da agência e da análise do relatório pelo pleno do tribunal.

Ao longo de 25 anos lutamos arduamente para estruturar o setor audiovisual desde a extinção da Embrafilme e do Ministério da Cultura em 1990.

De lá pra cá, conquistamos a Lei do Audiovisual (1993), construímos a Ancine (2001) e a Lei da TV Paga (2011), entre outros marcos importantes. Ao longo desses anos, saltamos de apenas 2 para 158 filmes lançados em 2017 --e contamos hoje com mais de 3.000 horas de conteúdo nacional independente sendo exibido anualmente na TV paga.

O volume de produtoras registradas na Ancine saltou de cerca de 500, em 2002, para mais de 9.000, em 2017. Destacamo-nos no mercado internacional, conquistando prêmios nos principais festivais do mundo, além de vendas para inúmeros territórios.

Cabe a todos --gestores, servidores, produtores, criadores, atores e todos os profissionais do setor-- defender a sólida política pública que temos hoje e a bem-sucedida execução dos projetos audiovisuais.

Todos abertos, sim, a aprimorar procedimentos --na gestão dos projetos e na gestão da agência--, mas sem comprometer a estabilidade conquistada ao longo de 25 anos.

Anos de construção, em diálogo transparente e estreito com o Congresso Nacional, com representantes do Poder Executivo e com os órgãos de controle da União.

Anos que devem nos levar a mais 25 anos de prosperidade, de boa gestão e de muito orgulho para nosso país.

Por DEBORA IVANOV, na Folha de São Paulo


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