O anúncio do Museu de Arte Moderna (MAM) do Rio de Janeiro de que vai
vender a pintura Nº16, do artista plástico norte-americano Jackson
Pollock, dividiu opiniões de órgãos federais de Cultura. Para o Ministério da
Cultura, museus têm autonomia para decidir sobre a venda de seu acervo. No
entanto, o Instituto Brasileiro de Museus (Ibram) criticou a decisão e pediu a
suspensão do processo. A obra faz parte do acervo do MAM desde 1954.
Com o dinheiro da venda, o MAM pretende criar um fundo, cujo rendimento
vai garantir uma receita estável por até 30 anos à instituição. Segundo a
direção do museu, o fundo permitirá o planejamento a curto, médio e longo
prazos, sem depender de recursos obtidos por empresas privadas, por meio da Lei
Rouanet. Com o fundo, o MAM quer ainda melhorar e atualizar as condições de
suas instalações.
O presidente do museu, Carlos Alberto Chateaubriand, disse que esta é a
primeira vez que o museu vai vender uma obra. A previsão é de que a tela
assinada por Pollock seja adquirida por cerca de US$ 25 milhões. Ele disse que
a instituição ainda não enfrente dificuldades financeiras. “Antes que a gente
comece a ter realmente dificuldades é melhor tomar uma atitude para não deixar
que isso aconteça. Temos várias responsabilidades com funcionários, manutenção
de acervo”, disse à Agência Brasil.
Ministério da Cultura
Por meio de nota, o Ministério da Cultura disse reconhecer e valorizar a
autonomia do MAM, “uma instituição privada que presta relevantes serviços à
cultura brasileira, à sociedade e ao país”. O órgão acrescentou que, por isso,
respeita e apoia a decisão da diretoria do espaço cultural. “A venda de obras
de acervo com objetivos específicos é prática comum em museus norte-americanos
e europeus e muitas vezes serve ao objetivo de garantir a sustentabilidade
financeira dessas instituições”.
O MinC afirmou que no caso do MAM, “embora a obra seja de inquestionável
relevância, sua venda, isoladamente, mostra-se suficiente para angariar os
recursos necessários à criação de um endowment [fundo para
manutenção da instituição] que assegurará a sustentabilidade do MAM-Rio”.
Para o ministério, com a opção pelo modelo de um fundo para a construção
de uma base financeira mais sólida, “a instituição demonstra estar olhando para
o futuro, alinhando-se com as tendências internacionais de excelência em gestão
de museus”.
Com isso, no entendimento do ministério, o museu se tornará menos
vulnerável a crises e menos dependente de doações e patrocínios, com maior
estabilidade financeira e viabilidade operacional.
“O resultado disso, no longo prazo, será a permanência da instituição e
a melhoria dos serviços que presta à arte brasileira e ao público. A venda de
uma obra assegurará a conservação adequada e a exibição das 16 mil
remanescentes, assim como o incremento da coleção de arte brasileira. A direção
do MAM-Rio tem total apoio do Ministério da Cultura e de suas instituições”.
Ibram
Já o Instituto Brasileiro de Museus informou, também por meio de nota,
que a decisão de vender a obra foi vista com surpresa pelo órgão. “Temos pleno
conhecimento com relação às profundas dificuldades financeiras que se
apresentam aos museus brasileiros no cenário atual e não podemos deixar de
reconhecer o esforço dos gestores dessas instituições em buscar alternativas
para enfrentar este momento adverso. Gostaríamos, no entanto, de ponderar que a
preservação de seus acervos é objetivo primordial dos museus brasileiros e
imperiosa obrigatoriedade para suas atuações”.
Segundo o Ibram, destacou que “os preceitos éticos que norteiam a gestão
dos museus acolhem a possibilidade de venda de obras unicamente se a renda
obtida for integralmente destinada à aquisição de outras obras, dentro de uma
política de aprimoramento de acervos. No caso presente, a situação é ainda mais
delicada, por tratar-se da única obra do artista no acervo do MAM Rio”.
Com este entendimento o Ibram pediu que o MAM não leve a venda a diante.
“Solicitamos assim, respeitosamente, a suspensão desta decisão, para que
possamos pensar de forma conjunta, em diálogo com as demais instâncias
governamentais e sociedade civil, outras soluções possíveis para os desafios
atualmente enfrentados pelo MAM Rio”.
MAM
O presidente do MAM informou que, somente de conta de energia, o MAM
gasta quase R$ 130 mil por mês. Os gastos mensais do museu, em média, alcançam,
segundo Chateaubriand, entre R$ 520 mil a R$550 mil. O MAM não conta com
recursos dos governos federal ou estadual. No que se refere à Prefeitura, nunca
recebeu uma contribuição sugerida pela Lei nº 1961/93.
Segundo o presidente, diferentemente do que ocorre nos Estados Unidos e
na Europa, onde são frequentes as doações de valores elevados para museus, e
até contribuições de cidadãos comuns, no Brasil não existe esta prática e o
financiamento acaba ficando a cargo de leis de renúncia fiscal, nos âmbitos
federal, estadual e municipal.
O museu solicitou ao Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico
Nacional (Iphan), autorização para continuar o processo de venda. Caso a
autorização seja concedida, o MAM informa que vai disponibilizar a obra ao
Ibram para que faça uma consulta aos museus brasileiros.
Se não houver interesse de nenhum deles, o MAM buscará, através de
comissão a ser criada para este fim, casas internacionais de leilão com amplo
histórico de credibilidade, como a Sotheby’s e a Christie's, para dar
transparência a todo processo.
Iphan
O Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan)
informou, no entanto, que não tem competência legal para se manifestar sobre a
venda da obra N° 16, uma vez que sua competência se restringe a
situações de venda de bens tombados e, neste caso, nem o museu, nem seu acervo
são tombados em nível federal.
“Conforme a legislação vigente no que se refere à circulação e ao
comércio de obras de arte, as competências autorizativas do Iphan limitam-se ao
universo dos bens protegidos em nível federal para situações de exportação
temporária de bens tombados e produzidos até 1889, desde que para fins de exposições
no exterior, com data definida para retorno”, completou em resposta à Agência
Brasil.
Agência Brasil